Geni é uma revista virtual independente sobre gênero, sexualidade e temas afins. Ela é pensada e editada por um coletivo de jornalistas, acadêmicxs, pesquisadorxs, artistas e militantes. Geni nasce do compromisso com valores libertários e com a luta pela igualdade e pela diferença. ISSN 2358-2618

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FARÓIS ACESOS │ Crítica da falta de noção impura

Ridículos: vocês são r-i-d-í-c-u-l-o-s. Apenas. Alguém pare esse ventilador porque eu simplesmente não aguento mais tanta merda. Por Neusa Sueli

Tá puxado, tá complexo, tá kantiano. A gente acha que vai ser colunista militante, que vai escrever matéria sociologicamente engajada – citar Marx, Engels, Bakunin, Zizek –, mas acaba mesmo é fazendo crítica da falta de noção impura. É tanta merda, MAS TANTA, que me sinto praticamente uma comentadora de campeonato de arremesso de esterco.

 

Luiz Felipe Pondé: SONO

Em sua coluna num desses jornais nada a ver, em 21 de abril, o filósofo (ri alto) e enfant pénible – aquele que fala-na-cara-mesmo-tô-nem-aí, sabe? – Luiz Felipe Pondé saiu por aí falando merda [insira aqui sua cara de surpresa, porque isso nunca acontece, claro].

 

Uma SALMA DE PALMAS, AUDITÓRIO.

 

luis felipe ponde revista geni cecilia silveira

 

Dessa vez seu alvo, PASMEM, foi a “esquerda” [insira aqui o seu “OH!”], a esquerda “pegadora” (sim, ele, em pleno século 21 ainda diz que homem “pega” mulher). Pondé nos relata a dor, o sofrimento e a mágoa que os coxinhas liberais (desculpem o pleonasmo) têm, pois para eles é difícil encontrar parceiras para se relacionarem sexualmente. Segundo ele, “o maior desafio para um jovem estudante liberal no Brasil é pegar mulher (no meio universitário e afins), sendo liberal. Claro, charme pessoal, simpatia, inteligência, grana, repertório cultural, sempre são fatores importantes, mas a esquerda tem um ponto a favor dela que é indiscutível: se você é de esquerda, pegar mulher é a coisa mais fácil do mundo. Qual o segredo da esquerda? É ser festiva”.

 

Se você é liberal e esse cara representa sua perspectiva, tá na hora de rever sua vida.

 

Sabe qual é a maior dificuldade para mulheres alfabetizadas no Brasil? Ler as merdas que esse ser escreve. Eu já deixei de fazer isso faz tempo (brinks, nunca li), mas é que esse mês todo mundo ficou me mandando essa porra de “artigo” (risos), e envelheci uns 15 anos tendo que ler aquilo (mentira, dormi na primeira linha). Parem de dar Ibope para ele, deixem-no morrer de inanição. É o tipo de cara que, no meio da foda, você acaba pegando no sono quando tá fazendo boquete, sabe?

 

A gente não dá para ele pelo simples fato de que ele é cansativo, bobo, boring. Ai, sinceramente? Nem vou me estender muito porque tô indo fazer uma gangbang com o pessoal do PSOL e do PSTU (sou wild, sorry). Já que ele anda tendo dificuldades para dar umazinha com as amapô de esquerda, tenta a Raquel Sheherazade, ou sei lá, “pega” o Lobão, o Roger. Tem também o pessoal que comenta nos artigos que ele escreve – só gente liberal e selecionada. Não desiste, Pondé: uma hora dá certo. Sucesso, felicidades.

 

 

G0ys: Love, Trust, Respect, Discretion, Masculinity… AND FALTA DE NOÇÃO

 

Tema de reportagens em diversos jornais e sites em abril, os g0ys (parece erro de digitação, mas é só falta de noção ortográfica) foram um dos assuntos mais discutidos pelas pessoas – DO MEIO e FORA DO MEIO (risos) – nas últimas semanas. Definindo-se como “homens que sentem desejo por outros homens, mas que também podem se relacionar com mulheres”, eles “não se identificam nem como homo nem bissexuais”, e afirmam que “têm relações sexuais com seus parceiros e não praticam a penetração”, que, aliás, “é reservada somente ao sexo com as mulheres”.

 

Até aí, gente, nada de novo no front, porque não vim ao mundo para dizer como as pessoas têm que se comportar, como o desejo delas tem que funcionar. Tem que goste de homem [ \o/ ], tem quem goste de mulher [ \o/ ], tem quem tenha tesão em avencas [ \o/ \o/ \o/ ], tem quem trepe com samambaias e violetas [ \o/ \o/ \o/ ], tem quem sensualize com postes na praça da República [ \o/ \o/ \o/ ], tem quem curta não dar a bunda […]. Mas foi BEM RIDÍCULO, aliás, o fato de algumas bees saírem por aí criticando esse grupo porque eles não curtem penetração. Vamos fazer o favor de respeitar o povo que não curte dar a bunda, porque não é porque a gente adora preencher nosso vazio interior (ops!) que todo mundo tem que achar incrível, espetacular. Façam o favor de não me cobrir de vergonha (eu era sem vergonha, mas vocês são tão sem noção que passei a ter vergonha alheia).

 

Acho engraçado que eles não querem uma etiqueta que os classifique, mas foram lá e criaram outra. Muito inteligente – parabéns a todos os envolvidos. Vocês me dão sono, sabia?

 

O que me deixou puta é o simples fato de eles serem, em uma palavra, PRECONCEITUOSOS. Olhem só o que esses g0yabas tiveram a pachorra de escrever no manifesto que está no site deles: “Nós G0YS entendemos que as imagens e estereótipos que são promovidos dentro da chamada ‘comunidade gay-macho’ são repugnantes para a nossa percepção de masculinidade e respeito. Sabemos instintivamente que amar outros homens não tem nada a ver com desvio de gêneros [sic], vestir ou desempenhar o papel feminino! Nós g0ys, por nossa própria natureza, rejeitamos qualquer coisa brincando dentro do ânus de outra pessoa; portanto, achamos que o conceito de “sexo anal” é sujo, degradante… Nós g0ys rejeitamos completamente o sexo anal!”.

 

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Desculpem a tradução ruim, mas é que além do conteúdo odioso, o site deles é uma das coisas mais feias que eu vi na internet nos últimos tempos. Tive que ler umas cinco vezes essa joça, porque achei que era efeito da ressaca da catuaba de ontem.

 

SEUS HORROROSOS! EM 2014 ver gente cagando regra assim para a sociedade é, para dizer o mínimo, pura falta de noção. Vocês não quererem dar o toba é direito de vocês, mas daí a vir vomitar bobagem e rotular a prática do outro como “suja e degradante” é ridículo. E sabe o que me deixa mais furiosa? VOCÊS TÃO SE SENTINDO A NOVA ONDA DO MOMENTO, MAS NÃO PASSAM DE UM BANDO DE MACHISTAS QUE NÃO DÃO BUNDA. Apenas. Deviam ter vergonha de sair na rua, e ficar em casa chorando em posição fetal. Francamente.

 

É incrível como tem gente que se diz CONTRA OS ESTEREÓTIPOS (#foradomeio #discreto #macho), mas que é um estereótipo em si. Deem só uma olhada nas imagens que eles põem no próprio site [vergonha alheia mode on].

 

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A gente lê o título do manifesto e já dá de cara com um “Discretion and Masculinity”, sabe. Olha só que originalidade. Eu ia fazer todo um discurso, mas, quer saber? O Pedro Pepa já falou tudo o que eu queria ter dito sobre esse neopreconceito contra nós, fabulous fags (façam o favor de ler). O que diferencia vocês de nós, pintosxs, (beijo pras amigues!) é que a gente não perde a oportunidade de rebolar gostoso e quebrar tudo até o chão, e você ficam só na vontade.

 

Tomara que o cu de vocês feche (amorosa, respeitosa, masculina e discretamente, claro), por pura falta de uso.

 

 

Yes, we have bananas! Nanicas, aliás.

 

Era tanta gente segurando banana na minha timeline que já estava achando que era cantada, sabe? Fui me inteirar do assunto e, para variar, em vez de apelo sexual era só falta de noção da humanidade.

 

No último domingo, 27 de abril, durante uma partida de futebol entre o Villareal e o Barcelona (Campeonato Espanhol), um torcedor imbecil jogou uma banana para o jogador brasileiro Daniel Alves, insinuando que ele – por ser negro – era um macaco. O jogador, como forma de reagir ao ato racista, comeu a banana e continuou o jogo.

 

No mesmo dia, à noite, o jogador Neymar (assessorado por uma agência de publicidade) tira uma foto com seu filho pequeno segurando uma banana. Depois dele, Luciano Huck com Angélica, Xuxa, enfim, toda a população de famosos imbecis de nosso amado país pegou o celular e resolveu tirar foto e postar na internet, usando a tag “#somostodosmacacos”, CHOCADOS com o racismo no Brasil. Ativismo social em tempos de internet é isso: reagir rápido e transformar uma das maiores ofensas que nós, negrxs, sofremos em “piada inteligente”, em boutade.

 

Nessa história toda, eu só fiquei com dó dos macacos. Não deve estar sendo fácil para eles serem associados a tanta gente sem noção. Todo o meu apoio a vocês, queridos símios. Em vez de bananas, seus imbecis, vocês deviam é comer noção e com farinha, cambada de ridículos!

 

somos todos bananas

 

Quantxs aqui têm ideia do quão doloroso é para umx negrx ser chamadx de macacx para saírem por aí dizendo que “#somostodosmacacos”? Quantxs têm consciência de que essa sempre foi a forma que xs brancxs utilizavam para desumanizá-los, para animalizá-los? “somostodosmacacos” uma pinoia! Falem por vocês, seus ignorantes! Respeitem os outros!

 

Batemos no peito para dizer “somostodxs [insira aqui alguma frase de efeito]”, mas o único predicativo que esse sujeito “nós” admite é “idiotas” – ou, o que me parece mais adequado (e triste) no momento, “cruéis”.
Pergunto-me qual o sentido de tanto desrespeito, e por que a necessidade de se autopromover em cima da desqualificação, do escárnio e do desrespeito ao outro.

 

Ando cansada dos chistes, da “ironia fina”, da marotice fanfarrona, da piada pronta, do “riso corrosivo”.

 

Esse tipo de estratégia de desqualificar o discurso alheio fingindo superioridade, de não dar a devida seriedade às coisas esvazia a discussão e, o que me deixa mais atordoada, esvazia a nós mesmos.

 

Cada vez que vejo uma piada feita com um assunto sério porque simplesmente as pessoas estão tão imbuídas de si próprias e seguras de suas opiniões, eu me esvazio um pouco também. Porque é como se admitisse que o outro simplesmente não importa – sobretudo porque a opinião dele é diferente da minha.

 

Estamos tão preocupados em termos razão (que as pessoas “curtam” e “compartilhem” o que dizemos), que sequer atentamos para a forma como o que dizemos afeta o outro. Ou, se vemos, simplesmente não nos importamos.

 

Antes ríamos para conseguir suportar o peso de nossas próprias vidas, mas hoje, definitivamente, rimos para tornar mais pesadas as vidas alheias.

 

Ou a gente se reinventa (seriamente), ou a gente vai para o abismo.

 

 

EM TEMPO: Agora que todo mundo resolveu virar macaco, poderiam aproveitar e agir com bom senso como os chimpanzés fazem em vez de sair aí se comportando como humanos – que estão aí envergonhando uns aos outros desde… sempre.

Leia outros textos da coluna Faróis Acesos.

 

Ilustração: Cecilia Silveira.

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