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DA SHANA | Ser ou não ser um sub mano, eis a questão

Versões de um mito de origem. Por Shanawaara

Publicado em 11/05/2016

Ser ou não ser um sub mano, eis a questão

 

A verdade é que ele é um sub mano.

 

Comecemos pelo começo.

 

Era uma vez umx lindx meninx que adoravaD I V A R

 

 

shana_quebradas

 

 

Era o fim dos anos 80.

Nossa história começa no Reino de Oz.

 

A verdade é que ele era uma criança viada.

 

CONTEXTO HISTÓRICO

Era 1989 quando o nefasto panfleto facista golpista revista Veja publicou a foto de Cazuza na capa com a mensagem Mais uma vítima da AIDS agoniza em praça pública.  A AIDS publicada como câncer gay. Não tenho ideia como isso afetou a experiência LGBT de toda uma geração.

 

Nesse contexto, uma criança viada crescia, desenvolvia-se e deveria ser educada.

 

— Ele é tão educadinho, né?!

Entendemos:

— Ele é tão viadinho, né?!

 

Não me lembro do Cazuza vivo.

Não me lembro dessa capa da revista Veja.

Não me lembro dos comados frustados que tentaram me transformar em um macho.

 

Mas vamos falar de coisa boa?

 

CONTEXTO HISTÓRICO

Era 1989 quando o Xou da Xuxa 3 tornou-se o LP mais vendido do país. Ilariê era um hit  tocado em toda a América Latina.  

 

Nunca existiu uma paquita negra.

Tampouco viada.

Os paquitos sempre tão sem graça.

 

Trancada em seu quarto, na cidade de Osasco, a nossa criança viada bate cabelo, organiza brincadeiras, canta, dança, compete sozinha consigo mesma.

 

Trancada em seu quarto, ela pode performar/ experimentar/ ser livremente uma criança viada. Ou melhor: uma criança rainha. As divas ainda não eram o grande produto da indústria do entretenimento.

 

Trancada em seu quarto, ninguém tinha avisado à nossa criança viada que rebolar, dançar e cantar com a  camiseta amarela da escola amarrada na cabeça era algo errado. Mas ela sabia que isso não era uma performance desejável a uma criança que se orgulhava da existência de um pinto entre as pernas.

 

Lip sync no teatrinho familiar pós ceia de natal:

Eu cresci, agora sou mulher.

– É o artista da família.

 

ADOLESCÊNCIA

Era o final dos anos 90 quando todxs xingavam a outra adolescente viada da sua sala.

Engrossar o coro dos manos, mesmo sendo um sub mano, era algo natural.

Só fui me dar conta da violência desse ato homofóbico anos depois.

Cultura escrota.

 

Ainda menino, ele era o orgulho da família. Inteligente, criativo, comunicativo e, graças a Deus – Deusas, s’il vous plaîtnão anda com os traficantes do bairro.

 

Alô Zona Norte.

Munhoz, Baronesa, Canaã, Portal, Rochdalle, Helena, Ayrosa, Piratininga.

 

A verdade é que nunca fez amigos no bairro.

Escondeu-se.

 

Aqui é Osasco, caraio!!

Campeão mundial 2012.

Osasco e Curinthia!!

Time dos sonhos: Sheilla, Garay, Jaque, Thaisa, Adenízia, Fabíola e Brait.

 

SER VIRGEM OU PUNHETANDO SOBRE UM PASSADO UÓ

Peito. Pele. Beijo. Buceta. Como será que é uma buceta? As pernas. Vem. Isso. Devagar. Pega no meu pau. Chupa gostoso. Hummm. Boca quente. IssoBate pra mim. Vadia. Rebola no meu pau. GostosoQue nem a Emanuele rebolava na rola do fortão. Queria o fortão comendo você também. Você chupando a rola dele. Ele te comendo com aquela rola gostosa que nunca aparece na tv. Queria mamar aquela rola gostosa que nunca aparece na tv. Pegar na rola. Tesão da porra. Me come. Sou virgem. Vai com calma. Isso. Fode. Fode. Fode pra caralho (CAROL, MC. 2011) Bem gostoso. Vem. Cheiro de macho. Deixa eu sentar em você. Delícia. VemVemTo quasequasevem… Ahhhhhh

 

Gozo contrariado.  

 

CARNAVAL

Era início dos anos 2000. Tatuí, interior de São Paulo. A hetenormatividade familiar. As máscaras não me caiam bem. O carnaval sem fantasia. Era impossível celebrar quem eu não era.

 

Esconder-se do carnaval.

Esconder-se de mim.

 

Até encontrar

 

O gozo.

A purpurina.

O choro no Rio.

A vida.

O corpo possível.  

 

A verdade é que MEU CORPO NÃO É LIVRE.  

 

A verdade é que sou um sub mano suburbano nascido na década de 80 no Reino de Oz.

 

– Boa noite, Dorothy. Para que lado fica a estrada de tijolos amarelos?

Coragem, coração, cérebro, corpo livre.

 

Procedimento e consciência.

 

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Ilustração: Emília Santos

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