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Escolas de luta
Geni nas ocupações de escolas em São Paulo. Por Fabito Figueiredo, Juliana Bittencourt e Lia Urbini
Publicado em 31/01/2016
Escolas de luta
A longa greve dos professores de 2015 (que durou 92 dias) terminou sem que o governo estadual se comprometesse com o reajuste salarial ou alguma outra pauta da paralisação, mas colocou na agenda de manifestações a educação pública.
Após o anúncio, em setembro, do plano de reorganização escolar pela Secretaria de Educação de São Paulo, uma série de ocupações foram realizadas pelxs estudantes como uma resposta à ameaça de fechamento de 92 escolas, transferência de alunos e lotação nas salas de aula. Xs alunxs conseguiram pressionar para que o plano fosse suspendido, e mais do que isso, a organização autônoma dos estudantes foi o início de novos intercâmbios de experiências entre xs próprixs alunxs.
O ano terminou com mais de 200 escolas ocupadas, apesar da ameaça de reintegração de posse, da pressão exercida pela direção e por alguns funcionários em muitas escolas. Apesar de constantes tentativas de apropriação da iniciativa dxs estudantes por outras organizações e partidos políticos, o movimento se manteve independente.
A estratégia dxs alunxs se diversificou com a difusão de manuais de como ocupar uma escola ou como travar uma avenida, a circulação de um jornal com informação produzida por elxs mesmxs e o uso das redes sociais como forma de visibilizar suas ações dentro das escolas (se organizando em comissões de limpeza, comida, comunicação, etc.). Um formulário para a doação de aulas circulou pela rede e alcançou uma oferta de mais de mil aulas em poucas horas de divulgação. Além disso muita gente simplesmente chegou junto nas escolas e propôs outras atividades e colaborações.
Algumas mães e pais eram contrárixs às ocupações, mas em outros casos deixavam xs filhxs participarem. Uma das perguntas mais frequentes que se escutava na porta das escolas era sobre quando as aulas voltariam. Quando percebiam que estavam acontecendo aulas e atividades diversas, que xs próprixs filhxs estavam “arrumando” a escola, muitos reconheciam as atividades como outro tipo de formação. Geni esteve em algumas das ocupações e compartilha o que encontrou.
Turbantes
Xs próprios alunxs propuseram atividades durante as ocupações. Na E.E. Heloísa Assumpção, em Osasco, uma das escolas visitadas pela Geni, elxs ofereceram uma oficina sobre gênero. Foi um dos estudantes que decidiu propor o tema, xs outrxs alunxs aceitaram e se iniciou um processo de autoformação. O fato dxs alunxs terem idades diferentes não impediu que o intercâmbio acontecesse. Além das discussões, aconteceu uma oficina de turbantes para meninas e meninos.
Na cidade, três escolas foram ocupadas ao longo do movimento, mas apenas essa conseguiu resistir, e alguns estudantes das outras ocupações depois se juntaram na Heloísa.
Maquiagens e sirenes
Em uma visita posterior da Geni à Ocupação Heloísa, agora com Shanawaara, o encontro começou com uma roda de conversa ouvindo sobre a ocupação, as experiências, conflitos, aprendizados. O bate-papo culminou no debate sobre gênero e contamos um pouco sobre o funcionamento da revista e o modo independente de organização.
Quando Shana chegou ao pátio, alguns dos meninos da ocupação disseram que queriam se maquiar também. E até o show começar, vários deles já estavam maquiados. No meio da performance, Shanawaara apenas ahazava no palco quando uma das estudantes pediu pra desligar o som. A caseira da escola havia chamado a PM reclamando do barulho, no mesmo instante em que a mãe de um estudante chegou e armou o maior barraco ao encontrar o filho maquiado.
A cena formada: show interrompido, nós dentro da escola sem poder sair, pois como maiores de idade poderíamos responder criminalmente pela ocupação. A PM no portão sem poder entrar, pois não tinham nenhum mandado e a mãe do moleque fazendo um escândalo junto a PM. Nessa confusão, xs estudantes tentando argumentar, enquanto lá dentro, ao nosso lado, alguns meninos ainda maquiados.
Foi lindo tudo isso. Passar maquiagem dentro da escola. Um pequeno e grandioso ato.
Diretora de cinema com pré-estreia na Caetano de Campos
Na Escola Estadual ocupada Caetano de Campos, Geni compareceu para uma sessão de cinema com pipoca. O filme projetado foi Osvaldão, com direção assinada por Anna Petta, André Michiles e Fabio Bardella.
A diretora Ana Petta, presente na atividade, nos contou que um mote importante para a produção do projeto foi o desejo de contribuir com mais imagens de personagens negros na história da esquerda brasileira. Além de parte da equipe da Geni, um professor e vários alunos assistiram a pré-estreia na ocupação.
O filme mostra partes da vida de Osvaldo Orlando da Costa, comandante negro da Guerrilha do Araguaia que virou herói entre o povo local, por conta de sua coragem e generosidade. Vindo de uma família que havia sido escravizada, tornou-se campeão carioca de boxe nos anos 1950, transformando-se em um dos principais guerrilheiros do país na década seguinte.
Fotos da projeção de Osvaldão na ocupação da Caetano de Campos da Aclimação. Por Gabriela Cunha.
Foto da diretora Anna Petta com cartaz de Osvaldão.
Agitação e propaganda com grupo de palhaças no Capão
Já na zona sul, a Geni acompanhou uma das várias apresentações que o grupo de teatro Madeirite Rosa realizou nas ocupações contra a reorganização. O Madeirite Rosa é formado por quatro mulheres que se reuniram para pensar agitação por meio da cultura já no fervo de 2013. Hoje elas buscam somar nas lutas e resistências por meio do teatro, unindo humor com conteúdo crítico às estruturas sociais e de poder. Situações de luta pelo transporte, moradia e educação foram momentos em que o Madeirite fez suas experimentações culturais.
A apresentação realizada na E.E. Prof ª Marilsa Garbossa Francisco foi do primeiro trabalho de repertório do grupo, “A luta”. Nesse trabalho, as meninas partiram de uma gague clássica de palhaço, a da luta de boxe, e se inspiraram em referências como Charles Chaplin e Buster Keaton. As referências também contam com o trabalho de grupos próximos como a Brava Companhia e a Trupe Lona Preta.
A peça narra a trajetória de uma faxineira lutadora, que desconstrói as imposturas do discurso meritocrático sem romantizar as dificuldades da articulação social de resistência. Ao final da apresentação, que aconteceu no mesmo dia do pronunciamento do governador sobre a queda do Secretário de Educação e a revogação da reorganização, houve um bonito debate com o grupo e xs estudantes.
Os percalços atravessados pela faxineira e a luta encenada foram associados ao processo de ocupação dxs estudantes que se reuniam ali, e muitas falas enfatizavam a felicidade de estar experimentando o espaço da escola de uma forma participativa e solidária, as novas amizades estabelecidas, as descobertas em relação às possibilidades de atuação política e reivindicação de direitos e também os medos e problemas enfrentados coletivamente ao longo das semanas de ocupação.
Madeirite Rosa, com a peça “A luta”, na ocupação da E.E. Profª Marilsa Garbossa Francisco, Capão Redondo. Por Lia Urbini
E o bonde segue!
Em São Paulo, as ocupações em mais de 200 escolas conquistaram no início de dezembro, dentre outras coisas, a suspensão da reorganização escolar em todo o Estado. Mas a mobilização segue. Em Goiás, em meados de janeiro, em torno de 25 escolas estavam ocupadas contra a implantação de Organizações Sociais na gestão do ensino. É continuar acompanhando e lutando pela educação pública e de qualidade para todxs. Força, estudantes, tamo juntxs!
Fotos: Gabriela Cunha e Lia Urbini
Ilustração: Paloma Franca Amorim